Dissertação de mestrado da Unimontes resulta em livro infantil que promove a inclusão

Júlia Rodrigues - 31-03-2022
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Belinha é uma menina de 7 anos inteligente e carinhosa. Porém, ela se acanha em sorrir ou falar por vergonha de suas cicatrizes. Belinha nasceu com fissura labiopalatina. Apesar de relativamente comum (a cada 650 crianças nascidas no país, uma terá a fissura), tal formação costuma ser motivo de estigma. No caso de Belinha, o acolhimento de seus amigos e professores é fundamental para que ela, enfim, aprenda a sorrir. 

Belinha é a personagem fictícia do livro “Belinha, a menina que aprendeu a sorrir!”, obra escrita por Carla Cristina Gonçalves da Costa, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde/Cuidado Primário em Saúde da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). "A personagem é uma metáfora para milhares de crianças e adultos espalhados pelo país que sofrem diariamente com os estigmas que seus portadores carregam", explica. O objetivo do livro é divulgar informações sobre fissuras orais e a importância do acolhimento ao "diferente". "O que curou a Belinha não foram os médicos, não foram os fonoaudiólogos ou dentistas que trataram dela, mas o amor dos seus colegas", diz a autora, que também é dentista referência da Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) de Montes Claros.

O livro infantil é um produto técnico parte da sua dissertação de mestrado “Anomalias dentárias na Síndrome congênita por Zika vírus e produção técnica em fissuras lábio palatinas”. Seus orientadores, Hercílio Martelli e Daniela Barbora Martelli, são também co-autores da obra. Segundo Hercílio Martelli, especialista em periodontia e patologia bucal e coordenador da Câmara da Ciências da Saúde da FAPEMIG, o livro apresenta linguagem acessível e didática, de caráter lúdico, para gerar educação em saúde, conhecimento e assistência aos diferentes atores sociais.


Capa do livro: "Belinha, a menina que aprendeu a sorrir!" (Foto: Reprodução)


PESQUISA 
O grupo atua da Unimonte realiza pesquisas envolvendo fissuras orais há mais 15 anos. Fissuras orais são uma anomalia congênita, ou seja, inerente desde o nascimento. Trata-se de uma malformação do lábio e do céu da boca nas primeiras semanas de gestação. Estes órgãos, que deveriam unir-se gradativamente, ficam separados parcialmente ou completamente formando uma fissura no lábio ou céu da boca (palato) ou os dois juntos (lábio palatinas).

Hercílio Martelli explica que suas causas são multifatoriais e podem ter conexão com fatores ambientais e genéticos “Algumas mutações genéticas já são bem conhecidas e fatores ambientais, como o consumo de bebidas alcoólicas, tabagismo materno, medicamentos como corticoides e anticonvulsivantes, além de carência nutricional e deficiência de ácido fólico, principalmente no primeiro trimestre da gestação, estão entre os fatores de risco”, aponta.

O professor também explica que o tratamento deve iniciar-se o mais precocemente possível, logo no primeiro mês de vida. Além dos procedimentos cirúrgicos, deve existir um acompanhamento com equipe multiprofissional. “Importa destacar sempre que o tratamento é realizado pelo SUS, deve iniciar o mais precocemente possível e é interdisciplinar, ou seja, envolve diferentes profissionais de diversas especialidades, como dentistas, médicos, nutricionistas, psicólogos e fonoaudiólogos, por exemplo”. Uma das principais dificuldades das famílias é encontrar apoio em centros de saúde, pois são poucos espalhados pelo país.

O processo de reabilitação se dá de forma longa, de 16 a 20 anos para finalizar. Mas, sem este tratamento, o paciente pode lidar com inúmeras intercorrências. “Estes defeitos anatômicos geram alterações funcionais (como na amamentação, deglutição) e estéticas, afetando diretamente a qualidade de vida do indivíduo e também indiretamente de sua família”, explica Hercílio.

PERSPECTIVAS
O objetivo da obra “Belinha, a menina que aprendeu a sorrir!” foi reduzir os estigmas e promover a inclusão, principalmente, no ambiente escolar. “O nosso maior objetivo sempre foi chamar a atenção de toda a sociedade para a importância do tratamento reabilitador, integral, realizado por uma equipe multi e interdisciplinar, desde o diagnóstico, com o envolvimento real da família e o melhor preparo da comunidade para acolher “o diferente”, explica Hercílio.

Publicado no ano passado pela editora Cora, o livro será disponibilizado, em breve, em formato de vídeo. A versão PDF é de distribuição gratuita, confira aqui.


Na foto, a Dra. Carla Cristina Gonçalves da Costa, autora do livro. (Foto: Arquivo Pessoal)