Uma pesquisa realizada pelo Laboratório de Inspeção de Produtos de Origem Animal (InsPOA) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) em parceria com Cooperativa dos Produtores Rurais do Serro (Cooper Serro) investigou o tradicional queijo do Serro em busca de definir as condições ideais que resultam no sabor e qualidade inconfundíveis do queijo artesanal mineiro, além de atestar a qualidade e inocuidade do alimento.
De acordo com o coordenador do projeto, professor Luís Augusto Nero, muitas características sensoriais do queijo tradicional como sabor, odor e textura são consequência do desenvolvimento de um conjunto de bactérias e fungos naturalmente presentes no produto. “O sabor ácido do queijo Canastra ou a textura ressecada do queijo do Serro, após intensa maturação, devem-se a microbiota específica”, exemplifica.
A iniciativa foi apoiada pela Chamada 08/2017 - Queijo artesanal: Tecnologias para o seu aprimoramento. O fomento teve como objetivo promover a sustentabilidade, a melhoria da qualidade e a inocuidade em toda a cadeia do Queijo Artesanal (QA) por meio da pesquisa aplicada e da capacitação de produtores.
Fonte: Pedro Vilela/MTur
Métodos combinadosPara definir a identidade e a qualidade dos queijos analisados, o estudo combinou diferentes técnicas laboratoriais. Nero explica que foram utilizados métodos cultura-dependentes, nos quais as amostras de queijos são diluídas e submetidas a análises microbiológicas, permitindo visualização e enumeração de colônias de diferentes grupos de bactérias; e métodos cultura-independentes, baseadas na obtenção do DNA total das amostras e caracterização da composição da microbiota por sequenciamento genético.
Segundo o professor, o uso de metodologias cultura-dependentes é uma abordagem clássica, mas que apresenta algumas limitações. “Como a microbiota é muito diversa, temos uma variedade muito grande de microrganismos, a gente não tem como reproduzir exatamente em laboratório as condições para que essas bactérias se multipliquem ou formem colônias visíveis", conta. "Quando utilizamos esses métodos cultura-dependentes, alguns grupos podem ser subestimados, a gente pode não encontrar com tanta facilidade alguns grupos que mesmo em quantidade baixa são importantes".
Por isso, em paralelo, o estudo combinou técnicas cultura-independentes. Nessa abordagem, o DNA é extraído de uma porção das amostras e é submetido ao sequenciamento genético, de forma a permitir a caracterização dos grupos microbianos que compõe a microbiota das amostras. Entretanto, Nero explica que mesmo essas metodologias cultura-independentes apresentam algumas limitações. “A técnica fica restrita a uma alíquota muito pequena que pode ser não representativa de toda a amostra e até mesmo apresentar DNA de microrganismos que podem não estão mais vivos”, conta.
“Todas as técnicas têm limitações. Hoje, consideramos que o caminho mais adequado para fazermos estes estudos de microbiota em alimentos é a associação dessas duas abordagens. Quando os métodos são aplicados associadamente, os resultados se complementam e são muito bons", explica Nero.
A pesquisa concluiu que a identidade do queijo artesanal produzido na região do Serro é estável, ou seja, as diferentes amostras coletadas apresentaram composição microbiana similar. O tradicional “queijo minas” apresenta boa inocuidade, ou seja, ausência de patógenos relevantes em produtos lácteos em níveis detectáveis.
Nero explica que a pesquisa pretende continuar os estudos a fim de selecionar algumas propriedades para compreender a dinâmica de alteração da microbiota em diferentes etapas da produção. Além disso, buscará caracterizar as bactérias láticas presentes no queijo e tentar selecionar as cepas responsáveis pela produção das características típicas deste produto.
"Desta forma, será possível utilizar essas culturas em condições controladas, permitindo a produção deste queijo também de maneira controlada. Assim, é possível preservar a identidade do queijo e, consequentemente, o Patrimônio Cultural do Estado além da diversidade bacteriana presente nesta cadeia leiteira", antecipa.
Patrimônio Cultural do Brasil
Pelo seu valor cultural e importância para a economia familiar, o bem “Modos de Fazer o Queijo Minas Artesanal nas regiões” é considerado o Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O queijo produzido na região do Serro, assim como o da Serra da Canastra e do Salitre são incluídos no título desde 2008.