Pesquisa investiga fatores causadores da mortalidade de espécies na APA Pandeiros

Júlia Rodrigues - 16-03-2023
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Pesquisadores do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em parceria com a Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) buscaram compreender o motivo que levava à mortalidade de árvores de pequi, cajuzinho e cagaita na maior unidade de conservação do Estado de Minas Gerais, a APA Pandeiros. O projeto foi coordenado pela especialista em patologia florestal, Nilza de Lima Pereira Sales, do Instituto de Ciências Agrárias da UFMG (ICA-UFMG).

De acordo com a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Cadevasf), a Bacia do Rio Pandeiros corresponde a uma área 398 mil hectares e abrange municípios como Januária, Bonito de Minas e Cônego Marinho. O “Pantanal Mineiro”, como também é chamado, tem importante participação na reprodução de 70% das espécies de peixes do rio São Francisco. A partir de 1995, criou-se a Área de Preservação Ambiental da Bacia Hidrográfica do Pandeiros, a APA Pandeiros.

Devido à monocultura irrigada, pecuária tradicional, desmatamento clandestino e uso mal planejado do fogo, o ambiente natural tem se deteriorado, gerando a ocorrência de processos de erosão, assoreamento e voçorocas. Por isso, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) divulgou a Chamada 11/2016 - Sustentabilidade da Bacia do Rio Pandeiros, buscando apoiar projetos de ação e pesquisa científica, tecnológica e de inovação que contribuíssem com a preservação, conservação e recuperação do meio ambiente na Bacia Hidrográfica do Rio Pandeiros, de forma compatível com o desenvolvimento socioeconômico da região.

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O projeto “Conservação e proteção de populações vulneráveis de pequi, cajuzinho e cagaita: estratégias para o desenvolvimento sustentável do Rio Pandeiros” investigou denúncias relatadas por representantes de extrativistas da região da APA Pandeiros ao Conselho Pro-Pequi sobre a ocorrência de grande mortalidade no campo de plantas de espécies frutíferas do Cerrado. “São espécies muito importantes socialmente e economicamente para toda comunidade da APA", destaca Sales.

PARTICIPAÇÃO DAS COMUNIDADES
O projeto buscou desenvolver junto às comunidades extrativistas tecnologias para conservar os ecossistemas e proteger espécies de interesse. Segundo Sales, esta parceria foi importante nas etapas decisivas. “O projeto envolveu grandemente a comunidade local desde o primeiro momento, de concepção da proposta, para definir os objetivos e também para selecionar a área de estudo", relata. "Precisávamos selecionar uma área onde o Cerrado estivesse preservado e onde as espécies estivessem protegidas durante, pelo menos dois ou três anos para coletar os dados".

Sales conta que o trabalho foi árduo. As pesquisas contemplaram seleção da área experimental, pesquisa de campo e laboratório, caracterização da flora, avaliação periódica das plantas, identificação de pragas e doenças. Durante a coleta de dados, foram avaliados 100 hectares da APA e 200 árvores de pequizeiro. “Uma vez por mês, foram realizadas visitas para realizar o monitoramento fitossanitário da planta”, conta. “Foram três anos de viagens entre Montes Claros e a APA”.


INVESTIGAÇÃO  
Para estimar os danos ao pequizeiro em áreas naturais, a equipe utilizou um veículo aéreo não tripulado (Vant). Sales explica que a adoção desta ferramenta foi um ganho muito grande para a pesquisa. “Com essa tecnologia, foi possível detectar as árvores mortas e, além disso, a porcentagem da severidade, ou seja, o quanto da árvore estava secando”, conta.

Localização da área estudada Foto: Nilza Sales/ ICA-UFMG

As pesquisas de campo também buscaram estudar a estrutura comunitária, a ecologia populacional e o sucesso reprodutivo de espécies frutíferas em áreas de Cerrado. Por meio de análises moleculares, observou-se que existe uma diversidade genética para as populações de pequi e cagaita. No entanto, evidenciou-se a formação de alguns agrupamentos de árvores muito parecidas geneticamente - pequenas populações isoladas, o que representa um perigo para a perpetuação da espécie.  “O que chamamos de erosão genética é a perda de diversidade genética. Restando poucos materiais genéticos no campo, propicia-se a extinção da espécie diante da incidência de uma doença ou ocorrência de uma praga”, explica a coordenadora do estudo.

PRINCIPAIS RESULTADOS 
Sales explica que ainda existe um longo caminho para percorrer, mas que algumas dúvidas dos pesquisadores foram solucionadas durante a pesquisa. A mortalidade das espécies estudadas, por exemplo, foi associada a um conjunto de fatores. Sales explica que, além de fatores bióticos como pragas e doenças, as mudanças climáticas agravaram a condição das espécies. “Um dos fatores responsáveis pela ocorrência dessas doenças e pragas pode ter sido o estresse promovido por um período de escassez hídrica e temperaturas elevadas na região ", explica.


O fungo Lasiodiplodia theobromae foi apontado como principal causador do adoecimento dos pequizeiros e danos severos às plantas. Já a broca-do-tronco do pequizeiro é a principal praga entre as plantas jovens e adultas. A pesquisa atualmente desenvolve a caracterização molecular do que seria uma espécie inédita de patógeno encontrado no cajuzinho do cerrado, responsável pela seca de ponteiros e manchas foliares, de forma severa, nas plantas de várias idades, podendo levá-las à morte.

Presença do L. theobromae nas folhas do Pequi. Foto: Nilza Sales/ ICA-UFMG


PROJETOS DE EXTENSÃO 
A pesquisa também envolveu ações de extensão, nas quais os pesquisadores atenderam diretamente 80 estudantes jovens e crianças de sete comunidades da APA-Pandeiros. Os eventos “Pandeiros Sustentável I e II” buscaram fomentar a conservação da natureza, o uso sustentável e a propagação de espécies nativas. Sales conta que a escolha do público-alvo se deu por considerá-los multiplicadores das informações para a sua comunidade. "Na verdade, foi uma troca porque as crianças e os jovens já em uma consciência muito grande porque os pais trabalham com a exploração dessas espécies e sobrevivem, muitas vezes, da coleta de frutos e da sua comercialização, mas não tinham a consciência da importância da preservação do ambiente onde elas ocorrem", conta Sales.

O projeto também convidou 20 representantes da APA para participar no evento “O Campo no campus” realizado no ICA-UFMG com a duração de um fim de semana. Foram ministrados várias oficinas e minicursos nas mais diversas áreas do conhecimento.