Estudos ampliam compreensão sobre a atuação da dopamina no cérebro adolescente

Júlia Rodrigues - 08-10-2024
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Apelidada de “Hormônio da felicidade” ou “molécula do desejo”, a dopamina nos ajuda a compreender o que está por trás de perguntas como: Por que nos viciamos? Como desenvolvemos comportamentos compulsivos? Como aprendemos coisas novas? 

A substância é, na verdade, um dos neurotransmissores responsáveis por transportar as informações entre as células do nosso cérebro. Apesar de pouco citado, a dopamina também tem papel importante no controle dos movimentos, na memória, na atenção e controle das emoções. 

Bruno Rezende de Souza, pesquisador associado do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e líder do Laboratório de Neurodesenvolvimento e Evolução (NeuroDEv), explica que a função desempenhada pela dopamina depende da área do cérebro para qual ela é enviada. 

Resultados de um estudo, publicado em fevereiro, na revista Behavioural Brain Research com pesquisadores do NeuroDEv demonstram que essas funções também podem mudar durante a fase da vida e sexo biológico dos indivíduos. Para isso, os pesquisadores testaram os efeitos do estímulo por dopamina, pela primeira vez, no comportamento de camundongos fêmeas e machos durante a puberdade

Hipótese dopaminérgica

A relação entre a dopamina e diagnósticos psiquiátricos já é conhecida pelos neurocientistas há longa data. Pesquisas desenvolvidas nos anos 60 e 70, já haviam observado que a alteração do sistema dopaminérgico motivada por fatores genéticos ou por fatores ambientais estão presentes em vários transtornos mentais como esquizofrenia, TDAH, autismo, depressão e transtornos de ansiedade - a chamada hipótese dopaminérgica. 

Souza explica que, atualmente, a ciência já reconhece que o fator não é o único envolvido nas alterações no desenvolvimento do cérebro apresentadas nesses diagnósticos, mas aumentam a probabilidade. O estudo desenvolvido pela UFMG investiga como a hipótese dopaminérgica atua no comportamento dos camundongos – que assim como os humanos, têm as mesmas regiões do cérebro afetadas. 

Souza conta que, até então, a imensa maioria das pesquisas foram feitas com animais adultos e machos. O estudo revela que a regulação desses comportamentos pela dopamina nos adolescentes é diferente em relação aos adultos e que a resposta comportamental também difere entre fêmeas e machos. A pesquisa em questão servirá de parâmetro para outros estudos com foco na adolescência.  

“A nossa pesquisa ajuda a entender um pouco da participação da dopamina no desenvolvimento do cérebro e no comportamento durante a adolescência e isso pode ajudar tanto na prevenção quanto no tratamento de transtornos mentais nessa fase da vida”, explica Souza.  

Fatores genéticos 

Em agosto, novo estudo publicado na revista Progress in Neuro-Psychopharmacology and Biological Psychiatry os pesquisadores observaram os efeitos das alterações no sistema dopaminérgico na fase pré-natal. Para isso, realizaram manipulação genética capaz de reduzir a quantidade do DARPP-32 – gene ligado a funções cerebrais encontradas em pacientes com esquizofrenia em embriões de uma espécie de peixe chamada zebrafish ou paulistinha. 


Estudo dopamina cérebro dos zebrafish  Fonte: Bruno de Souza/UFMG

O peixe encontrado no sudoeste da Ásia tem tamanho próximo de cinco centímetros e compartilha com os seres humanos quase 75% dos seus genes. Souza explica que o zebrafish é utilizado na neurociência como substituto do camundongos e neste estudo contribui para avaliação do desenvolvimento do cérebro na fase intrauterina de forma menos invasiva. 

“Nós vimos que quando reduzimos a quantidade do gene, alteramos o desenvolvimento do cérebro e o comportamento dos peixes”, explica Souza. Para o pesquisador, se for possível relacionar a alteração do desenvolvimento com o gene alterado em uma janela específica da gravidez, possivelmente, no futuro, poderemos prevenir transtornos mentais na vida adulta. 

“Se compreendemos o papel desses genes já logo no começo da vida, podemos ajudar no diagnóstico já no pré-natal e realizar atividades preventivas para que o embrião tenha menos chance de desenvolver algum transtorno”, estima Souza.