O consumo de cafeína é uma dúvida frequente entre grávidas. Muitas querem saber se devem abrir mão do cafezinho e a quantidade segura para não prejudicar o bebê. Atualmente, a recomendação das organizações internacionais de nutrição e do Ministério da Saúde é que as gestantes ingiram entre 200 e 300 miligramas de cafeína por dia, valor encontrado em até três xícaras de café, quatro copos de refrigerante ou quatro xícaras de chá. No entanto, um estudo desenvolvido por uma aluna do Programa de Pós-Graduação em Biologia Celular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostrou que essas doses podem não ser tão seguras. A pesquisa mostra que a ingestão da cafeína pode comprometer o desenvolvimento fetal e placentário.
O principal alerta para as grávidas é sobre alimentos que contêm cafeína. É comum que se esqueçam da presença da substância em produtos que vão além do café, como por exemplo, chocolate, refrigerantes, chás, energéticos e alguns remédios. A nutricionista e doutoranda, Thaís de Mérici, explica a necessidade de se repensar o consumo em gestantes. “Sempre achei essa recomendação muito alta. A cafeína tem a capacidade de atravessar a placenta e atingir o feto. Este, por sua vez, não consegue eliminar a substância que fica circulando no seu organismo entre 12 e 24 horas”.
De acordo com Thaís de Mérici, a cafeína pode causar alterações na placenta, onde ocorrem as trocas gasosas entre mãe e feto. Tais alterações podem levar ao nascimento de indivíduos menores, com baixo peso, e que tenham predisposição a apresentar doenças crônicas na vida adulta, em função da ocorrência de restrição intrauterina de crescimento (RIUC).
Os experimentos foram feitos em camundongos, que têm placenta parecida com a humana, além de metabolizar a cafeína de forma semelhante a humanos. Os animais foram avaliados nos terços inicial e final da gestação, quando ocorre a formação da placenta e próximo ao nascimento, respectivamente.
“Observamos que os vasos da placenta ficam muito alterados por causa da cafeína e os fetos ficam menores e mais leves, o que caracteriza a ocorrência de RIUC”, explica a professora do Departamento de Morfologia e responsável pelo projeto, Fernanda Almeida. Foram pesados fígados e cérebros dos fetos e feita uma relação ente os pesos. Tal medida revela que o desenvolvimento do cérebro é preservado em detrimento ao dos demais órgãos, sendo uma estratégia que o feto desenvolve para sobrevivência. Ainda segundo ela, a RIUC predispõe o indivíduo ao desenvolvimento de outras doenças como diabetes, hipertensão, obesidade, síndrome metabólica, câncer, doenças cardiovasculares, dentre outras.
Muitas gestantes não estão atentas para a presença de cafeína na alimentação. “Talvez não deem importância por pensar que as gerações anteriores consumiram cafeína e nunca tiveram problemas. No entanto, doenças crônicas, de que não se sabe a origem, podem ter relação com a vida intrauterina”, diz Thaís de Mérici.
O estudo chama a atenção para a importância do tema para que novos estudos sejam desenvolvidos e ajudem na elaboração de políticas públicas relacionadas à nutrição de grávidas. “O problema não é apenas a recomendação de cafeína para a gestante, mas medir o consumo da cafeína”. Ideal, segundo a nutricionista, é que os produtos alertassem ao consumidor sobre a presença de cafeína.
A pesquisa de Thaís de Mérici foi feita sob a orientação dos professores Fernanda Almeida e Enrrico Bloise. O estudo recebeu o prêmio YW Loke New Investigator Travel Award 2019, no congresso da Federação Internacional das Associações de Placenta, na Argentina.
Texto publicado originalmente no site Minas Faz Ciência. Para ler mais matérias como essa acesse aqui.