Devido ao caráter corriqueiro de seus sintomas, o câncer de ovário é dificilmente percebido por quem tem a doença. Estima-se que em três quartos dos casos o diagnóstico só acontece quando a patologia atinge um estágio avançado. Por isso, ele é o tumor ginecológico com maior taxa de mortalidade no país. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), há a previsão de pelo menos 6.650 novos casos da doença, até 2020.
Na busca de encontrar formas de combater essa e outras formas da doença, um grupo de pesquisadores do Brasil, Reino Unido e Itália desenvolveu um composto que age de forma potente e seletiva contra o câncer de ovário. A pesquisa foi realizada durante o doutorado de Carolina Gonçalves Oliveira, professora do Instituto de Química da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Sob a orientação de Victor Marcelo Deflon, do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC-USP), Carolina e os outros pesquisadores utilizaram o paládio – metal nobre – como base do composto. Durante os estudos, o material mostrou-se eficiente no combate das células cancerígenas do ovário.
“No início, desenhamos vários compostos contendo os metais paládio e platina. Isso foi feito a partir de um design dos compostos utilizando uma molécula orgânica juntamente com os metais de interesse. Os compostos foram preparados, estudados quimicamente e, depois de terminada a síntese e caracterização, nós os testamos contra várias linhagens cancerígenas. Vimos que um dos compostos de paládio se mostrou promissor especificamente para o câncer de ovário”, detalha a pesquisadora.
Atualmente, o tratamento do câncer de ovário é feito por meio da cisplatina, um quimioterápico eficiente, mas com severos efeitos colaterais. Segundo Carolina Gonçalves Oliveira, é comum que os pacientes apresentem resistência ao composto e não respondam corretamente ao tratamento. Tal resistência pode ser intrínseca ao paciente ou pode ser adquirida com o tempo.
Além disso, a cisplatina, apesar da eficácia comprovada, pode afetar os rins, o sistema nervoso e a audição dos pacientes. Isso acontece porque o quimioterápico combate não só as células tumorais, mas também as células saudáveis.
“O composto de paládio que nós desenvolvemos apresentou atividade em células resistentes à cisplatina. O aspecto mais importante e o mais promissor de nosso estudo foi que nós conseguimos descobrir um dos mecanismos de ação do composto de paládio. Trata-se da inibição da topoisomerase, enzima presente nas células, enquanto o modo de ação da cisplatina é pela ligação direta com o DNA celular. Logo, sem essa enzima, o DNA não consegue replicar a célula cancerosa”, assegura.
Durante o estudo, a toxicidade do composto de paládio também foi avaliada. Descobriu-se que o composto de paládio não apresentou toxicidade para as células saudáveis sendo dessa forma seletivo para apenas as células doentes.
Entretanto, os experimentos até então realizados foram in vitro, ou seja, o composto não foi testado em seres vivos. Por isso, “não é possível dizer que o teste in vivo vai ter o mesmo resultado, pois trata-se de um experimento diferente”, pondera Carolina. A realização de testes do comportamento do composto em seres vivos é a próxima etapa do estudo e deve ser realizada ainda este ano.