Ambiente concentra pesquisas de ponta em biotecnologia e faturamento milionário
Quando se fala em pioneirismo e inovação em Minas Gerais, é imprescindível destacar a participação da Universidade Federal de Viçosa (UFV). A história da instituição se entrelaça tanto na criação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), quanto na implementação do primeiro parque tecnológico a entrar em funcionamento no estado: o tecnoPARQ.
A Fundação foi uma das apoiadoras da construção do parque tecnológico, no início dos anos 2000. “A FAPEMIG teve papel fundamental. Foram dois ou três convênios importantes, junto à Finep (Financiadora de Estudos e Projetos, agência do governo federal), que viabilizaram o início das obras”, lembra Adriana Ferreira de Faria, professora da UFV e diretora do tecnoPARQ. “O projeto foi aprovado em 2008, e em 2011 o parque entrou em operação com duas empresas residentes”.
Atualmente, o parque tem cerca de 90 empresas vinculadas em programas que vão da aceleração à residência. Em 2024, elas chegaram a faturar cerca de R$ 140 milhões e geraram mais de mil empregos diretos. “Só para comparar, o orçamento da cidade de Viçosa gira em torno de R$ 400 milhões”, ressalta Adriana. “Ou seja, o parque representa uma parcela significativa do dinamismo econômico do município”.
O parque ainda possui um laboratório de prototipagem, o TecnoMAKER Lab, para atender às necessidades de produtores rurais, pesquisadores, professores, estudantes e empreendedores. Créditos: Bárbara Melo/FAPEMIG
A construção de um ecossistema
Antes mesmo da Lei Federal de Inovação (publicada em 2004), a UFV ousou ao implantar um ambiente de inovação em uma cidade com pouco mais de 80 mil habitantes. “Nossa incubadora de empresas é de 1996, quando nem se falava em lei de inovação. E a comissão de propriedade intelectual foi criada em 1998”, conta Adriana.
A trajetória do tecnoPARQ foi possível, em grande medida, graças ao apoio financeiro e institucional da FAPEMIG. Entre 2007 e 2008, quando o Governo de Minas lançou um programa voltado à criação de parques tecnológicos, Viçosa já estava preparada: tinha base científica sólida, uma incubadora premiada e uma comunidade universitária engajada com o empreendedorismo.
O tecnoPARQ foi o primeiro parque tecnológico a entrar em operação em Minas Gerais - antes mesmo do BH-TEC, em Belo Horizonte. Desde então, o parque consolidou-se como um dos principais ambientes de inovação do Brasil, recebendo reconhecimento internacional. Há quatro anos consecutivos, o TecnoPARQ figura entre as quatro melhores práticas de parques tecnológicos do mundo segundo a IASP (International Association of Science Parks).
Um vetor de desenvolvimento econômico e social
Mais do que abrigar empresas, o tecnoPARQ é um vetor de transformação para Viçosa e para Minas Gerais. Empresas nas áreas de biotecnologia, tecnologia da informação e serviços inovadores compõem o ecossistema do parque. Entre os casos de sucesso está a Microbiotec, empresa criada em 2012 a partir do projeto de TCC de Roberto Dias, hoje doutor em Biologia Celular e Estrutural e sócio-diretor da instituição.
A planta piloto foi preparada para produzir cerca de 30 mil litros de bacteriófagos para a Petrobrás. Créditos: Bárbara Melo/FAPEMIG
Com sede no tecnoPARQ, a Microbiotec é um exemplo da jornada empreendedora do ambiente. “Estamos aqui desde a pré-incubação, então a empresa chegou aqui como uma ideia e tivemos todo o apoio do pessoal do parque para desenvolver essa ideia, para ver como isso poderia virar um produto”, conta Dias. Criada com a proposta de ofertar soluções inovadoras na área de biotecnologia, atualmente a empresa trabalha com a pesquisa personalizada, desenvolvimento e comercialização dos produtos à base de bacteriófagos para diferentes aplicações. Algumas das soluções desenvolvidas pela empresa foram contempladas em projeto aprovado na chamada Compete Minas de 2023.
“Nós desenvolvemos vírus que infectam bactérias para o mercado. Então a gente já trabalhava com eles formando coquetéis de fagos para controle de biofilme em sistemas de osmose inversa”, explica o diretor. Atualmente, a empresa implementou uma planta piloto para a produção dos bacteriófagos em grande escala com o principal objetivo de atender uma de suas principais clientes que é a Petrobrás.
Outro exemplo é a Recombine Biotech, que atua com tecnologia recombinante aplicada ao agronegócio e é liderada pela jovem doutora Ana Cláudia Alves. A empresa é fruto do seu doutorado em Bioquímica Aplicada pela UFV. “A gente começou em 2019 e participou de toda a trilha empreendedora do TecnoPARQ. O primeiro recurso que aprovamos foi em 2020, pela Finep, e em seguida, 2023, pela FAPEMIG, por meio da chamada Compete Minas. Nele, nós fomos classificados em primeiro lugar”, conta a cientista.
Os testes rápidos desenvolvidos pela empresa podem detectar alguns tipos de microrganismos, como a bactéria da salmonella. Créditos: Bárbara Melo/FAPEMIG
“Atualmente, nós temos três linhas de atuação dentro do agronegócio. A primeira delas é na saúde animal, onde desenvolvemos vacinas recombinantes para animais de produção, especialmente suínos. Temos uma linha de agricultura com biodefensivos agrícolas baseados em RNA de interferência, sendo uma tecnologia super disruptiva para o agronegócio. E desenvolvemos testes rápidos com foco nas agroindústrias. Essa última linha é o que recebeu o financiamento pelo Compete Minas”, completa.
Desafios e o futuro da inovação em Minas
Hoje, o tecnoPARQ mantém um portfólio sólido com foco na biotecnologia e no agronegócio, áreas estratégicas para Minas Gerais. Além disso, é o coordenador do Arranjo Produtivo Local (APL) de Biotecnologia reconhecido pelo governo estadual, fortalecendo ainda mais sua conexão com o território. O apoio do ambiente ainda promove a criação de produtos extremamente qualificados e empresas que despontam no mercado.
Exemplo disso é a empresa Microbiota Brasil que possui um vasto serviço especializado em biotecnologia agrícola e personalizado para cada cliente. O trabalho oferecido contém desde fenotipagem e compatibilidade, a produtos e experimentos em vegetação. Com apoio do TecnoPARQ e qualidade nas entregas, a empresa foi certificada por quatro anos seguidos como empresa destaque do ambiente de inovação e no mesmo período despontou de dois para 17 funcionários.
O trabalho desenvolvido pela Microbiota envolve uma equipe multidisciplinar altamente capacitada. Créditos: Bárbara Melo/FAPEMIG
“O tecnoPARQ nos ajudou muito. A gente sempre teve muita experiência na parte científica, nós somos doutores. Mas essa parte de empreendedorismo não a nossa expertise e o parque nos deu essa bagagem”, comenta Meiriele da Silva, sócia e cofundadora da Microbiota Brasil. A empresa também participou da chamada Compete Minas nos últimos anos e foi contemplada com recursos pra o aprimoramento das técnicas de consultoria.
Apesar dos avanços, a sustentabilidade dos parques tecnológicos ainda é um desafio no Brasil. “Nenhum parque jovem consegue se manter com recursos próprios. A médio e a longo prazo, o financiamento público é essencial”, aponta Adriana Faria. Ela defende uma política perene de apoio aos ambientes de inovação, não dependente apenas da vontade política do governo vigente.